terça-feira, 6 de maio de 2008

Bibliotecas vivas

Um proverbio oriental diz que a cada velho que morre é uma biblioteca que se perde para sempre.

Ora, para quem se interesse, esta é uma verdade incontestável.

Ontem passei várias horas da minha folga à conversa com umas pessoas mais velhas. Não são velhas! Andam pela casa dos 50 mas quando falam do seu tempo é difícil acreditar que estamos-nos a referir à mesma terra.

Eles narram costumes desaparecidos e hábitos perdidos com um saudosismo que magoa ver. Pintam com as lembranças a tela da nossa imaginação e aparecem imagens desta terra bela, florida, generosa e pura mas que da mesma maneira exigia dos humanos dedicação e trabalho de sol a sol.

Hoje vou contar uma destas pequenas memórias de que apenas outras gerações se recordam. Memória do dia a dia que há apenas 40 anos atrás eram comuns mas que hoje, tão pouco tempo depois, parecem aos mais novos coisa inexplicável e surreal.


Disse-me o Sr. Camilo:

"Antigamente, o primeiro centeio que se apanhava era imediatamente usado para as nossas camas. Pode parecer estúpido mas este era um dia de alegria!"

"Antigamente não havia conforto. Na minha casa não havia fome mas as casas eram de pedra e madeira. Tinham as chaminés a deitar fumo por dentro, não tínhamos luz nem agua corrente. Aquilo ao fim do dia não chegava-mos a casa e descansava-mos como hoje nos sofás! Não tínhamos condições e, no inverno nem banho podíamos tomar. Depois de um dia de trabalho, sujos de suor e terra, se o tempo viesse frio muito pouca gente tinha as condições de se lavar. Não era por as pessoas serem porcas. Muitos eram-no!... Mas para a maioria, tomar um banho no tempo do frio era arriscar a vida. Naquele tempo a gripe matava!"

"Por isso, quando chegava a época da apanha do centeio era uma alegria! E isso porque durante os primeiros dias, o centeio depois de malhado, era usado para encher os colchões. Os colchões eram feitos de uma capa de linho com um fecho de correr a meio que se enchiam com a palha."

"Por isso, ao fim de um ano a dormir ali em cima, aquilo tinha ficado duro, sujo e amassado. Bastava chegar este dia e encher os colchões com palha fresca para que fosse um motivo de festa e alegria. Depois de alguns dias a dormir neles, o centeio acamava criando espaço para mais umas braçadas que passariam a compor melhor a cama."

"Não estás a imaginar a satisfação que uma coisa destas dava. Dormir uns tempos num colchão mole e lavado era o que bastava naquele tempo para uns dias bem passados."

E hoje? O que é preciso para alegrar uma família?

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